quarta-feira, 24 de setembro de 2025

O admirável mundo do trabalho na era da IA (de)generativa — e a luta contra a escala 6×1

 




Por Ricardo Antunes

Na era da expansão dos algoritmos e da Inteligência Artificial (IA), qualquer previsão sobre o futuro do trabalho corre o risco de ser mais um embuste. Impulsionada pela financeirização do capital, a IA é explícita em seu objetivo: transferir para as máquinas inteligentes tudo que hoje é realizado pelo trabalho humano. Alguém poderia dizer: mas isso não é bom? Não teremos trabalhos mais qualificados, mais “criativos”, vivenciando um mundo laborativo mais humano e mais tempo de vida? 

A resposta está nas atividades que se expandem nas sombras da IA, com seus microtrabalhos ultra precarizados, especialmente (mas não só) no Sul global. Esses trabalhadores realizam jornadas ilimitadas, excluídos de todos os direitos do trabalho, recebendo níveis de remuneração indigentes, de modo a gerar informações para a IA. E quem encontra trabalho nas startups está experimentando uma “invenção” chinesa, o chamado “S-996”: jornadas que vão das 9h da manhã às 9h da noite, durante 6 dias consecutivos, totalizando uma jornada de 72 horas semanais. Eis os novos experimentos que se expandem neste admirável mundo do trabalho na era da IA.  

A síntese é límpida: eliminação de trabalho vivo em uma gama enorme de atividades, substituindo-o pelo trabalho morto, como se vê na ciberindústria. Mas atenção, há luz no fim do túnel para os descartáveis e supérfluos: sobreviver através do trabalho uberizado, que se expande globalmente nas plataformas digitais. Plataformas que se utilizam do mito do “empreendedorismo” visando proletarizar ao limite, mas  recusando-se a reconhecer a condição de assalariamento; impondo, através do “comando invisível dos algorítmicos”, jornadas prolongadas, além de vedar peremptoriamente qualquer forma de proteção do trabalho. Tendência que defini, em O privilégio da servidão, como uma nova era de escravidão digital — e que os CEOs, esses novos predadores digitais, consideram como sendo “moderna”. 

Um aparente paradoxo aflora e um novo espectro se avizinha: com a expansão celerada da IA generativa, sem controle e regulamentação, estamos presenciando, em plena era digital, a retomada de modalidades pretéritas de trabalho, pautadas pela trípode exploração, expropriação e espoliação, vigente no início da Revolução Industrial. O crowdsourcing, hoje, é uma variante digital e algorítmica do velho outsourcing, no qual homens, mulheres e crianças trabalhavam à margem da legislação protetora do trabalho, com jornadas ilimitadas e condições de trabalho desumanas.1  

Estamos, então, frente à IA generativa? Ou adentramos perigosamente na fase da IA degenerativa, concebida e plasmada pelo sistema de metabolismo antissocial do capital?  

Sabemos que a tecnologia foi, desde sua gênese, resultado da inventividade humana, que nasceu com o primeiro microcosmo familiar. Com o advento do capitalismo, a tecnologia foi se metamorfoseando e adequando ao modus operandi do capital. Toda “inovação” surge para, de fato, mais valorizar e, assim, muito mais acumular!  

O resultado em relação ao trabalho, podemos assim vaticinar: um novo espectro ronda o mundo do trabalho, o espectro da uberização. Mas erra quem pensa que não há resistência.  

6×1: 6 pontos contra e nenhum a favor

Foi durante a campanha eleitoral de 2024 que nasceu o movimento VAT/Vida Além do Trabalho, contra a jornada 6×1contemplando dimensões centrais da vida cotidiana, que a seguir resumimos:

  1. A redução da jornada de trabalho se configura como uma ação central da classe trabalhadora para minimizar a lógica destrutiva do capital, uma vez que acarreta, de imediato, a redução do desemprego;
  2. Essa luta se constituiu em antídoto real à exploração do trabalhotanto absoluta quanto relativa, assim como no início da Revolução Industrial (com o ludismo);
  3. Ela se opõe, em alguma medida, ao despotismo fabril das eras taylorista/fordista e toyotista, bem como, hoje, ao trabalho uberizado. Vale recordar o excepcional Breque dos Apps, de 31 de março e 1º de abril (dia da mentira) de 2025, contra o despotismo  algorítmico, mais invisível, mais interiorizado, que invade sutil e sorrateiramente nossa vida e trabalho;
  4. Lutar contra a escala 6×1 possibilita também vislumbrar outro ponto crucial: uma vida desprovida de sentido no trabalho é incompatível com uma vida cheia de sentido fora do trabalho2;
  5. Isso nos leva a sonhar com o fim das barreiras entre tempo de trabalho tempo livre. E, ancorados em outra forma radicalmente distinta de IA, a vislumbrar uma nova sociabilidade emancipada, autodeterminada, com indivíduos livremente associados, fora dos constrangimentos do capital;
  6. Por fim, ao  lutar pela redução da jornada, poderemos indagar: produzir o que? E para quem?  

Assim, o mundo do trabalho se entrelaça, decisivamente, com outro imperativo crucial de nosso tempo: impedir a destruição da natureza, como nossos povos originários nos ensinaram.

* Este texto foi originalmente publicado no Jornal da Unicamp com o título “Inteligência Artificial (de)generativa e jornada 6×1”.

Notas

  1. Ver Icebergs à deriva: o trabalho nas plataformas digitais (Antunes, R., Organizador, Boitempo, 2023) e Uberização, trabalho digital e indústria 4.0 (Antunes, R., Organizador Boitempo). ↩︎
  2. Ver Os sentidos do trabalho, edição especial de 25 anos (Boitempo, 2025), particularmente o capítulo X.  ↩︎

***
Ricardo Antunes é professor titular de sociologia do trabalho na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e coordenador da coleção Mundo do Trabalho, da Boitempo. Organizou os livros Riqueza e miséria do trabalho no Brasil IIIIII IV, Infoproletários: a degradação real do trabalho virtualUberização, trabalho digital e indústria 4.0 e Icebergs à deriva: o trabalho nas plataformas digitais, todos publicados pela editora. É autor, entre outros, de Os sentidos do trabalhoO caracol e sua conchaO continente do labor, O privilégio da servidão e Capitalismo pandêmico — seus livros foram editados em 14 países. Foi professor visitante na Universidade Ca’ Foscari em Veneza, na Universidade de Coimbra e Visiting Research Fellow na Universidade de Sussex. Recebeu recentemente o título de Doutor Honoris Causa na Universidade Nacional de Rosário na Argentina (junho de 2025).

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quarta-feira, 17 de setembro de 2025

Demon Slayer: Kimetsu no Yaiba — Castelo Infinito é espetáculo cinematográfico visceral

 review por Jorge Boruszewsky

Quem acompanha o anime Demon Slayer: Kimetsu no Yaiba, já está ciente da estratégia de transformar arcos do mangá criado por Koyoharu Gotouge em filmes e depois dividi-los em episódios, lançando como uma temporada do anime regular. E depois de já ter visto esse processo acontecer inúmeras vezes, é inevitável não encarar isso como uma estratégia para alongar ainda mais a vida útil da série, assim como foi feito com Attack on Titan nas suas sagas finais

Porém, diferente do anime dos gigantes, Demon Slayer sempre executou melhor a sua qualidade técnica, entregando espetáculos visuais melhorados a cada novo lançamento. E Demon Slayer: Kimetsu no Yaiba — Castelo Infinito, filme lançado em julho no Japão e no dia 11 de setembro, aqui no Brasil, é mais uma prova disso. Aliás, o filme foi a terceira maior estreia nos cinemas de 2025 em nosso país, ficando atrás somente de Invocação do Mal 4 e Lilo & Stitch

Visualmente lindo em todas as suas (muitas) cenas de luta e com um 

ritmo frenético logo no início, Demon Slayer: Kimetsu no Yaiba — Castelo Infinito, cumpriu todas as expectativas geradas desde quando encerrou o Arco do Treinamento dos Hashiras, lá no episódio 63 do anime. E é justamente aí que o filme começa, quando o mestre dos Hashiras, Kagaya Ubuyashiki, se sacrifica para deter o vilão Muzan Kibutsuji, que consegue sobreviver e ainda leva os nossos heróis para dentro do seu domínio, o Castelo Infinito do título do longa. 



Os Hashiras só querem vingar o seu mestre

Dali em diante vemos os caçadores sendo separados e lutando individualmente (ou em dupla) contra os Luas Superiores, os demônios mais fortes do esquadrão das Doze Kizuki, que servem diretamente a Muzan, o rei dos demônios. 

Cena da melhor batalha do filme

Demon Slayer: Kimetsu no Yaiba — Castelo Infinito entrega tudo o que já vimos no anime. Lutas fenomenais; técnicas com um visual de encher os olhos; muitos sacrifícios e histórias tristes de personagens do lado dos mocinhos e dos vilões. Talvez aí esteja o motivo do longa receber a classificação para maiores de 18 anos, já que os flashbacks contando o passado de algumas pessoas é digno de qualquer filme de terror no estilo gore, com sangue escorrendo pela tela e cenas de cortar o coração. E falando nessas lembranças que nos são apresentadas, talvez sejam nelas que o filme se estenda um pouco demais, perdendo o timing de algumas lutas e tirando toda a construção épica que acabou de ser mostrada na batalha. Um dos maiores exemplos disso é a luta final, na qual Tanjiro e Giyuu Tomioka (Hashira da Água) enfrentam Akaza, o Lua Superior de número 3. 

Akaza é um adversário difícil de ser derrotado

Mesmo indo ao cinema e sabendo que estava vendo uma “série compilada em um filme”, fica aquela sensação de que Demon Slayer: Kimetsu no Yaiba — Castelo Infinito poderia ter sido algo com mais cara de filme. As suas 2h35 provam que ele é praticamente uma temporada de anime sendo maratonada em tela grande. Claro, essa é a única ressalva, já que temos lutas memoráveis, personagens arrancando gritos de euforia da plateia toda vez que uma técnica inédita era apresentada e uma animação impecável, mantendo a qualidade que sempre foi marca registrada dessa produção do estúdio Ufotable. 

Prepare-se, pois esse é apenas o primeiro filme da trilogia do Castelo Infinito, que terá a sua conclusão em 2029.


fonte: https://www.vigilianerd.com.br/demon-slayer-kimetsu-no-yaiba-castelo-infinito-e-espetaculo-cinematografico-sem-timing/

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sexta-feira, 12 de setembro de 2025

Contornando o algoritimo do Medo e o podre do You Tube

 




Esse ano me bateu uma "bad" coisa ruim, relacionada a pobreza de conteúdo que se tornou o youtube nos ultimos anos. Pode ter sido pela mudança de monetização que fez com que reels e videos curtos se tornassem mais populares e almejados pelos vulgos criadores de conteúdo, mas dai eu percebi que sim o youtube antigo havia morrido, mas ainda assim tem coisas muito boas para serem vistas na plataforma, basta apenas saber "contornar" o tal algoritimo, então eu resolvi criar uma lista usando o chatgpt para me ajudar a fazer um filtro sobre assuntos que podem ser buscados e tentar qualificar sua timeline com menos gente imbécil falando coisas para apenas ganhar views sem ter nada a dizer...então tá ai a lista, espero que melhore seu dia e sua vida como um todo...abraço!

  • Ciência explicada de forma acessível
    • Palavras-chave/strings: "documentário explicado", "como funciona>", "explicando [fenômeno]", "entendendo [tema]"
  • Pensamento crítico e método científico
    • Palavras-chave: "pensamento crítico", "falácias", "método científico em ação", "como testar hipóteses"
  • História das ideias e filosofia da ciência
    • Palavras-chave: "história da ciência", "filosofia da ciência", "pensadores críticos", "desenvolvimento do conhecimento"
  • Pseudociência, ciência da evidência e checagem de fatos
    • Palavras-chave: "desmascarando pseudociência", "checagem de fatos", "evidência científica", "revisões sistemáticas"
  • Políticas públicas e tomada de decisão baseada em dados
    • Palavras-chave: " análise de políticas públicas", "dados e evidência", "impacto de políticas públicas"
  • Economia, sociedade e desigualdade baseada em dados
    • Palavras-chave: "economia baseada em evidências", "desigualdade de renda", "política pública e economia"
  • Meio ambiente, ecologia e mudanças climáticas
    • Palavras-chave: "mudanças climáticas explicadas", "ecologia", "conservação", "impactos ambientais"
  • Saúde pública, medicina e ética médica
    • Palavras-chave: "saúde pública", "medicina baseada em evidência", "ética médica"
  • Tecnologia, IA e ética
    • Palavras-chave: "IA e sociedade", "ética da tecnologia", "futuro do trabalho e IA"
  • Educação, aprendizado e métodos pedagógicos
    • Palavras-chave: "educação baseada em evidências", "aprendizado ativo", "metodologias ativas"
  • Neurociência e tomada de decisão
    • Palavras-chave: "neurociência básica", "viés cognitivo", "tomada de decisão"
  • Sociologia da ciência, inovação e cidadania
    • Palavras-chave: "inovação tecnológica e sociedade", "ciência cidadã", "democracia e ciência"
  • Jornalismo investigativo de ciência e ciência cívica
    • Palavras-chave: "jornalismo científico", "investigação científica", "cidadania informada"
  1. Formatos de vídeo que favorecem raciocínio
  • Documentários longos e aprofundados (30–90 minutos)
  • Explicações estruturadas com demonstrações/visualizações
  • Análises de estudos de caso com dados e fontes citadas
  • Entrevistas com especialistas + contrapontos
  • Séries didáticas que constroem conceitos passo a passo
  • Resumos críticos de livros ou pesquisas com fontes
  • Vídeos de debate com perguntas para reflexão
  1. Como buscar de forma prática
  • Combine termos de conteúdo com "documentário", "explicando", "análise crítica", "em profundidade", "caso de estudo".
  • Use filtros do YouTube:
    • Duração: escolha vídeos mais longos quando quiser profundidade.
    • Data de publicação: priorize conteúdos recentes para evidência atual.
    • Legendas/closed captions: ajudam na compreensão e na checagem de terminologia.
  • Exemplo de strings de busca prontas:
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  1. Critérios rápidos para avaliar qualidade
  • Fontes citadas: o vídeo cita estudos, relatórios ou fontes específicas?
  • Transparência de método: há explicação do que foi observado, como foi analisado e quais dados foram usados?
  • Equilíbrio de perspectivas: o conteúdo apresenta contrapontos ou reforça apenas uma visão?
  • Evidência vs. opinião: há distinção clara entre dados/estudos e interpretações?
  • Qualidade de produção: boa clareza, gráficos legíveis, narrativa coerente e fontes ao final?
  • Atualização: o tema é atual e refletido com evidências recentes?
  1. Sugestões de playlists curadas (para você começar já)
  • Playlist 1: Pensamento Crítico 101
    • Focos: fundamentos do método científico, falácias comuns, como avaliar evidências.
  • Playlist 2: Ciência na Sociedade
    • Focos: como políticas públicas são embasadas por dados; impactos sociais de avanços científicos.
  • Playlist 3: Ciência para Todos
    • Focos: explicações simples de temas complexos (clima, saúde, tecnologia) com visualizações claras.
  • Playlist 4: Tecnologia e Ética
    • Focos: IA, privacidade, automação, implicações sociais e debates éticos.
  • Playlist 5: Educação Baseada em Evidências
    • Focos: métodos de ensino eficazes, avaliação crítica, ensino de ciências e matemática.
  • Playlist 6: História das Ideias e da Ciência
    • Focos: como as ideias mudam, contexto histórico de descobertas, lições para o pensamento crítico.
  1. Dicas rápidas para melhorar a curadoria pessoal
  • Salve vídeos com fontes citadas e que expliquem o método.
  • Crie notas rápidas com perguntas-chave após assistir (O que foi afirmado? Quais dados foram usados? O que falta?).
  • Varie as fontes: assista a vídeos de diferentes países e perspectivas para evitar viés.
  • Combine conteúdos de produção alta com materiais de divulgação técnica para aprofundar.
  • Defina metas simples: por exemplo, 2–3 vídeos por semana e uma breve reflexão escrita ou auditiva.

https://www.cartacapital.com.br/sociedade/com-a-palavra-os-idiotas/

https://veja.abril.com.br/coluna/o-leitor/os-imbecis-venceram-na-internet-e-criaram-o-imperio-da-bocalidade/

https://www.quora.com/Why-is-YouTube-full-of-junk-content-Seriously-why-do-people-make-videos-of-the-most-irrelevant-crap

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